Em um site de notícias gospel, lê-se, em tom
de celebração, a aprovação do requerimento 114/2013, na Câmara de Caruaru, na
sessão do dia 7 de fevereiro. O documento, de autoria do vereador Sivaldo
Oliveira (PP), trata sobre a criação do Polo Gospel durante os festejos juninos
da Capital do Agreste.
De acordo com a home page, “O Polo Gospel sera mais
um Atrativo durante o Festejos Juninos em Caruaru sendo que voltado para o
Publico Religioso, Durante o Mês de Junho Caruaru sempre foi carente de Eventos
voltados Principalmente para o Publico Evangélico e agora com essa
Vitoria na Câmera Municipal o Polo Gospel vem para suprir
um Necessidade do Publico Evangélico durante o período
junino”.
Antes de tudo, quero deixar claro que nada tenho
contra o referido edil, tampouco desejo incitar ódio nos meus amados irmãos do
segmento evangélico. Entretanto, quero fazer observações sobre o tema.
Inicialmente, é bom frisar que o fato de um
requerimento ter sido aprovado na Câmara não significa que ele será,
fatalmente, colocado em prática. O que a Casa aprovou foi que a solicitação
chegue ao Poder Executivo, o qual analisará a viabilidade de implementação do
mesmo. Portanto, tal tópico deverá render ainda maior debate.
Também quero afirmar que não é papel de vereador
ficar organizando evento. Segundo trecho de definição do papel do vereador no
site Brasil Escola, “eles devem trabalhar em função da melhoria da qualidade de
vida da população, elaborando leis, recebendo o povo, atendendo às
reivindicações, desempenhando a função de mediador entre os habitantes e o
prefeito”.
Acredito que é necessário elaborar normas que
viabilizem a implementação de políticas públicas transformadoras. Os políticos
– principalmente os vereadores – não são eleitos para representar determinada
classe social (seja determinada crença, bairro, profissão, orientação sexual),
mas sim para garantir o bem estar da coletividade.
No entanto, para alcançar esse entendimento é
necessária uma profunda mudança da consciência. Enquanto isso, vão chover nas
sessões ‘ordinárias’ da Câmara enxurradas de requerimentos irrelevantes. E não
são apenas como esse do vereador supracitado, tampouco o grotesco pedido de
criação do Parque Municipal Gospel (conforme solicitado pelo edil Demóstenes
Veras, na última legislatura). Isso vale também para os incontáveis
requerimentos de calçamentos de ruas, mudanças de nomes de vias, ou coisas
desse tipo. Nesses últimos casos, porque tais solicitações não são acompanhadas
de um olhar mais abrangente para a infraestrutura da cidade, mas servem apenas
como uma forma de fazer uma média com tais comunidades. Vou tentar ser mais
claro. Ao invés de ficar fazendo requerimento para calçar rua A ou B,
deveria-se estudar mecanismos de urbanização da cidade como um todo, de maneira
planejada e estratégica.
Semelhantemente, ao invés de propor um polo gospel
no São João, poderia se propor uma mudança na perspectiva da festa. Em vez de
os festejos juninos caruaruenses se limitarem a parte musical em si, poderia-se
sugerir que oficinas, seminários, e outros instrumentos de formação cultural
aconteçam paralelamente à festa, sobretudo no período diurno. Ora, é tão
perceptível no mês de junho avistar, por exemplo, estudantes cabulando aulas
para participarem das comemorações no Pátio de Eventos (até porque, às vezes,
principalmente nas escolas mais próximas àquele lugar, torna-se uma odisseia
conseguir dar aula). Em vez disso, porque não criar possibilidades de que a
juventude tenha um acesso mais aprofundado à cultura popular? Isso estaria,
evidentemente, atrelado a um projeto de fomento à cultura, que permeasse também
outras áreas e outros períodos, no intuito de promover uma nova postura da
sociedade diante da vida, enfocando a identidade cultural – o que resulta em
uma consciência cidadã.
E eu acredito que esse tipo de cosmovisão deva
partir dos políticos com formação cristã, principalmente evangelical. Além
disso, outras pautas, como a questão da exploração infantil e sexual, os
problemas ambientais, a opressão contra as classes menos favorecidas, devem ser
o alvo dos que estão representando o povo, principalmente aqueles que têm como
objetivo de vida manifestar o Reino de D-us entre os homens.
Os olhos do cristão vocacionado para a política
devem estar voltados para o contexto geral e não para satisfazer
micro-interesses da igreja. Vale lembrar que o Memorial Evangélico de 1932
propõe, entre outros itens, “completa laicidade do Estado e [...] do ensino
oficial”; “justiça popular, rápida e gratuita”; “absoluta liberdade de
pensamento e da manifestação do pensamento”.
Desta feita, ressalto a observação do sociólogo Paul
Freston, quando afirma que “como cristãos, somos chamados a ver a realidade
brasileira, à medida do possível, na perspectiva de Deus, a pensar ‘o que
precisa se mudado para que o Brasil se pareça mais com o plano de Deus para
toda a humanidade’”. Uma nova cultura deve ser implementada. Ela começa aqui e
agora e termina na cidade que desce do Céu, onde “não haverá luto, nem pranto,
nem dor”.