Dentre as obras de Caravaggio, ‘A Vocação de São Mateus’ é uma das que mais provocam debates e reflexões. A tela, com traços realistas, parece fazer saltar ao mundo real o que está expresso no versículo 09 do capítulo 09 do Evangelho de S. Mateus: “Passando por ali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria, e disse-lhe: ‘Siga-me’. Mateus levantou-se e o seguiu”.
O domínio da luz, inerente à verve do pintor barroco, é evidente na obra. O contraste da luz que entra pela janela no ambiente escuro parece representar o contato do mundo espiritual com o terreno – este reproduzido no grupo de pessoas à mesa e aquele pela figura do Senhor Jesus Cristo ao lado de São Pedro.
Os indivíduos sentados à mesa parecem ter idades e posições sociais distintas. O mais relevante deles é Mateus, trajado de forma elegante e com uma postura de proeminência. Sem dúvida, uma boa exibição do que seria a conduta dos cobradores de impostos do primeiro século.
No texto neotestamentário, o verbo que foi traduzido por ‘ver’ é ‘theáomai’, que tem o significado de ‘mirar com atenção’, dando a ideia que o Senhor estava contemplando o caráter de Mateus quando do seu chamamento. Na tela, essa concepção ganha ainda mais força através do desenho da mão de Cristo, que possui uma relação intertextual com a ‘Criação de Adão’, de Michelangelo. Se o fresco presente na Capela Sistina indica a força divina criadora, a tela do pintor de Merisi aponta para o mistério da salvação.
Da mesma forma que o chamamento do Mestre transformou o publicano em evangelista, a luz que dEle emana chega a cada um de nós como um convite à plenitude do amor. Que possamos aplicar o exemplo de Mateus e, levantando-nos, decidamos ficar ao lado de Jesus.
Jénerson Alves