Em um opúsculo chamado ‘A paz na família’, Francisco Faus compara o coração humano a um instrumento de cordas – a exemplo de um violino, de uma harpa, ou de um piano. Ora, para uma música harmoniosa ser extraída de um instrumento, é mister que um bom intérprete realize uma boa execução das notas musicais, observando elementos como compasso, tempo e melodia. Contudo, por mais virtuoso que seja o artista, é impossível interpretar uma bela música se as cordas do instrumento estiverem desafinadas. É impraticável apresentar um concerto com instrumentos dissonantes.
Seguindo neste raciocínio, Faus é categórico: “(…) o coração também tem as suas cordas. Umas cordas que se chamam virtudes ou defeitos. São as cordas da humildade ou do orgulho, da fortaleza ou da moleza, da preguiça ou da laboriosidade, do otimismo ou pessimismo, da generosidade ou da mesquinhez… Virtudes que soam bem, ou defeitos que soam mal”. Assim, entendemos que as desarmonias não nascem, necessariamente, do que “os outros fazem ou dizem”, mas de como nosso coração recebe as palavras e ações que a ele chegam.
Temos de prestar atenção à música que nosso coração toca, bem como ouvir o canto do coração do nosso próximo. O filósofo Abraham Kaplar já apontou que é necessário superar o “duólogo”, isto é, conversas em que as pessoas falam para si mesmas e não se abrem para o verdadeiro diálogo, que acontece com alteridade e empatia. O maior exemplo está em Deus. Já no Antigo Testamento, o salmista testifica que o Senhor “se inclina” para nos ouvir (Sl 116), o que indica uma escuta permanente e empática. Que possamos ouvir o que nossos irmãos e irmãs expressam; e que possamos compor belas canções em nosso interior, sabendo que o Pai das Luzes nos ouve continuamente.
Texto: Jénerson Alves
Imagem: Interior with Woman at Piano, Strandgade 30, por Vilhelm Hammershøi